cantinho de meus poemas

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sexta-feira, 26 de março de 2010

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- Enforcam, não é?- Não. Em França eles cortam for...
- Enforcam, não é?- Não. Em França eles cortam fora as cabeças.- Gritam?- Como poderiam? Aquilo é feito em um instante. Fazem o homem ficar deitado e então uma grande facadesce, pelo próprio peso. Uma máquina poderosa, chamada guilhotina. A cabeça pula fora antes que a pessoapisque! Os preparativos são horríveis. Mal acabam de ler a sentença, aprontam o homem, atam-no, levam-nopara o cadafalso - e isso é que é terrível! Juntam-se multidões, até mulheres, embora não gostem que asmulheres assistam.- Não é coisa para elas!- Naturalmente que não. Naturalmente Uma coisa assim, tão hedionda! O criminoso era umhomeminteligente, de meia-idade, forte, corajoso, chamado Legros. Mas lhe garanto que quando subiu para o cadafalsoestava chorando, e mais branco do que uma31folha de papel. Não é incrível? Não é hediondo? Quem pode chorarde medo? Nunca me passou pela cabeça que um homem já feito não uma criança, mas um homem que nuncachorou, um homem de quarenta e cinco anos, pudesse chorar de medo! O que nãodeve estar se passando na suaalma, nesse momento!? A que angústia não deve ela estar sendo levada!? É um ultraje para uma alma, eisque é! Está escrito: "Não matarás!" E então, porque ele matou, o matam? Não. Isso está errado! Já faz um mês queassisti a isso, mas me parece estar ainda vendo com os meus olhos. Já tenhosonhado uma meia dúzia de vezes.Míchkin, enquanto falava, estava completamente mudado; uma ligeira coloração subira ao seu rosto pálido,muito embora a sua voz continuasse gentil. O lacaio seguia-o com simpáticointeresse, tanto que o desagradou tero príncipe se calado. Ele, decerto, também era um homem de imaginação e desensibilidade, cujo pensamentotrabalhava.- Ainda é uma boa coisa que, pelo menos, não haja muito sofrimento quando a cabeçacai.- Quer saber de uma coisa? O senhor fez justamente uma observação que já ouvi de muitas outras pessoas- prosseguiuo príncipe, acalorando-se - e a guilhotina foi inventada com esse fim. Mas, naquela ocasião, me ocorreu opensamento de que talvez isso fosse pior. Pode lhe parecer absurda e bárbara esta minha idéia, mas, quando setem imaginação, se chega, como eu, a supor isso. Pense! Se houvesse tortura, se, por exemplo, houvesse sofri-mento, um ferimento que desse agonia corporal, e tudo o mais, isso pelo menos distrairia o espírito, desviando-odo sofrimento moral, de maneira que só se seria torturado pela dor física até que se morresse. Mas a principal epior pena não está no sofrimento corporal e sim em se saber com segurança matemática que, em uma hora,depois em dez minutos, a seguir em meio minuto, e, depois, já, bem agora mesmo, neste segundo, a alma devedeixar o corpo, e se vai cessar de ser homem; e que isso tem de acontecer!... O pior de tudo isso está em que écerto. Quando o senhor deita a sua cabeça lá, debaixo da lâmina, e a ouve escorregar vindo para a sua cabeça,este quarto de segundo é o mais terrível de todos. O senhor note que isso não é imaginação daminha parte. Muitagente tem dito o mesmo. Vamos a ver se consigo lhe dizer cabalmente o que sinto. Matar, por causa deum assassinato, é uma punição incomparavelmente pior do que o próprio crime cometido. O assassinato32por sentença judicial é incomensuravelmente pior do queassassinato cometido por bandidos. Quem quer que seja assassinado por bandidos,e, cuja garganta tenha sidocortada, em um bosque, à noite, ou qualquer coisa assim, naturalmente que espera escapar até o último momento.Tem havido casos de uma pessoa aindaesperar escapar, correndo, ou suplicando misericórdia, e já depois da garganta ter sido cortada! Mas no outrocaso, a que nos estamos referindo, toda esta última esperança, que faz morrer dezvezes, como é fácilcompreender, está suprimida. pois se sabe que é certo, Há uma sentença; e toda a medonha tortura jaz no fato deque não há, certamente, meios de escapar. E não há, no mundo, tortura maior do que esta. Podem-se comandarsoldados, mandar que um deles se coloque diante de um canhão, em batalha, e ele saberque vão dispará-lo sobreele: ainda assim, terá uma esperança. Mas leia o senhor uma dada sentença de morte a esse mesmo soldado e eleou enlouquecerá, ou cairá em lágrimas. Quem já afirmou que a natureza está capacitada para suportar isso, semloucura? Para que e por que essa revoltante, inútil e desnecessária atrocidade? Talvez, por aí haja algum homemque já tenha sido exposto a tal tortura e a quem tenha sido dito: "Vai-te embora. Estás perdoado!" Tal homemdecerto, nos pode dizer que foi dessa tortura e dessa agonia que Cristo falou, também. Não, não se pode tratarassim uma criatura humana!"No Direito, até hoje em 2009 nos vemos no dilema filosófico das sanções penais, do que elas representam para a população. Se devem trazer à tona o "exemplo" ou se o Estado não tem o direito de aplicar à sociedade o que é certo por sua ideologia, apenas corrigir ações que prejudiquem a manutenção desta, não havendo portanto o poder ideológico suficiente para matar uma pessoa que matou outra.No percurso da história, a sanção a criminosos começou com a autotutela - as pessoas agiam por conta própria para se defender. O motivo, como se tratava de uma busca de sanção pessoal, era sempre a vingaça; os mais fortes garantiam a impunidade, e não havia regras quanto aos atos punitivos -, com o avanço dos agrupamentos e a criação de regras para que a vida em conjunto fosse harmoniosa, a autocomposição aflorou como uma opção àqueles que já se sentiam algo protegidos por normas que bloqueavam o abuso dos mais fortes, sendo ela um tipo de resolução de conflitos no qual uma ou ambas as pessoas envolvidas resolve o problema por desistência, subissão ou concessões múltiplas.A autocomposição não se relaciona com a situação das sanções a que me refiro, porque é uma pacificação de problemas que não envolve diretamente uma punição. Tampouco a autotutela pode ser comparada nos seus resultados-morte com as sentenças estatais às quais me referi no início. Ambas, apareceram ao início da vida do ser humano, como alternativas "primitivas" de resolução de problemas inter-humanos, quando não havia organização complexa como os Estados de hoje. Portanto, a polêmica da imposição de penas capitais está diretamente ligada ao início das jurisdições, e consequentemente, ao início da formação dos Estados pelo mundo. Na jurisdição, um problema dentro da sociedade só pode ser resolvido com a participação de um terceiro em nome do Estado chamado juíz ou árbitro, que definirá o modo com este conflito será dissolvido, definirá o sujeito culpado pelo problema, e sua punição.O Estado passa a definir o tipo de punição que o indivíduo "merece" pelos seus atos, e além disso, deve levar em conta o exemplo ao resto da sociedade e a eficácia na dissolução total do problema causado.Porém, desde os primórdios das punições estatais pela jurisdição, nasceu o problema da eficácia dos atos punitivos estatais para com os culpados.A pena de morte era comum e aceitável em todos os Estados antigamente, mas com a mistura do catolicismo na cultura ocidental e ainda a prevalência da democracia por aqui, nos vimos às voltas com a eficácia das penas capitais. Vale mesmo a pena ter um instituto tão primitivo relacionado ao princípio do "olho por olho, dente por dente" do Código de Hamurabi em uma sociedade que defende a vida, a dignidade humana e a liberdade como basilares da manutenção de um Estado feito para o povo?Na democracia, a minha opinião, conseguida com um pouco de dedução lógica e fria, é que racionalmente não cabe a imposição de tal pena. A democracia é sistema de organização estatal baseado no princípio de que se governa para o povo, e por pessoas do povo, de sua escolha. Se em nossa sociedade a maior das leis é a inviolabilidade da vida, nada daria direito aos nossos representantes de agir adversamente, pois que não é de nosso interesse.Aqui utilizo-me de argumentos de natureza totalmente adversa dos usados por Míchkin em "O Idiota". Embora se note que ele claramente chegou à mesma conclusão usando a lógica - ao comparar o sofrimento psicológico causado pela tortura e pela pena capital - Míchkin tirava suas conclusões dos sentimentos que lhe batiam ao pensar em uma e em outra situação que eram ambas ruins à nossa visão ocidental e democrática. Para ele a pena capital era cruel porque o terror psicológico de saber que iria morrer era maior do que aquele de saber que iria sentir dor excruciante por um tempo indeterminado, sem saber se ao final morreria ou não. Míchkin não criticava a pena capital como imprópria para ser aplicada pelo Estado, porque sabia que naquela época ela era, gras às ideologias predominantes na Suíça, e entendia que em Petersburg não cabia a pena capital por que o sistema era outro. Tanto quanto eu, ele subentendia que a pena de morte é conveniente ou não, dependendo do sitema do Estado, e seu diálogo demonstra uma visão tão fresca e pessoal de um assunto ainda tumultuoso, que vale conferir essa obra como um surpreendente relato da mente humana que mantém seus medos e revoltas, atravessando séculos e sistemas de Estado adversos.Em 1868 os Estados eram muito diferentes dos de hoje em dia, mas quando olhamos para a sociedade, para seus legados, como o livro de Dostoiévski, vemos um sentimento punjante de justiça que através dos séculos não desvanece em clareza, embora os argumentos possam ser tão díspares.Sobre o AutorEstou engajada no curso de Direito da UFRN, em Natal.Comentários (0)Seja o primeiro a comentar sobre este artigo!

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